Tenho lido os mais diferentes pontos de vista sobre a produção alternativa de vinhos. Segundo o produtor francês Jean-Pierre Amoreau, membro da longa descendência de proprietários do Château Le Puy, implantado em 1610, nesta casa secular sempre se trabalhou as videiras valendo-se de tratos culturais orgânicos e práticas enológicas isentas de produtos químicos.
Alguns ranzinzas escrevinhadores desandam em críticas acerca dos produtos ecológicos como se fossem donos absolutos da verdade.
A vitivinicultura tradicional sempre foi orgânica e, ao longo dos milênios, esteve baseada na ausência de produtos químicos e agrotóxicos. Segundo produtores franceses, foi somente a partir da necessidade de reaproveitamento das grandes sobras de matéria-prima para munição da Primeira Grande Guerra, que os vinhedos passaram a ser bombardeados pelos agrotóxicos, herbicidas, pesticidas e fertilizantes químicos. Assim, deu-se o advento da viticultura química!
Cresci no meio de vinhedos brasileiros e me desenvolvi através de vinhas do mundo afora. Testemunhei a pulverização sem parcimônia de fixadores químicos que precedem à aplicação de agrotóxicos. Na Austrália, o herbicida era tão ativo que foi desenvolvida uma máquina com protetores para não borrifar produto no caule... a videira não suportaria. O herbicida destina-se a matar as ervas “daninhas” mas os seus resíduos menos agressivos penetram no solo, são captados pelas raízes, alimentam as uvas e podem aparecer no vinho.
Na italiana Fratelli Bolla, devido a esquemas similares de seus fornecedores, ocorrem análises laboratoriais para identificar a presença destes resíduos no vinho e, na ocorrência, condenam-no à rejeição.
O assunto é tão importante que muitas vinícolas respeitáveis do mundo estão procurando formas de atenuar o uso de produtos nocivos à natureza e ao homem.
Um primeiro movimento chama-se PIF – Produção Integrada de Frutas que é uma metodologia reconhecida internacionalmente, passível de certificação do produtor. É baseada no tempo de atividade do agrotóxico aplicado que cumprido perde a nocividade e não deixa resíduos na fruta.
Nesta linha está a filosofia chamada Raisonée, que elimina a utilização programada dos agrotóxicos que só é aplicado na ocorrência de problemas.
Uma tecnologia recente é o controle térmico de pestes (TPC – thermal pest control). Um trator circula pelo vinhedo puxando um equipamento pulverizador que emite jato de ar a elevada temperatura e a alta velocidade o qual age sobre as videiras eliminando fungos, bactérias e pragas. Como resultado final, o método acorda o sistema imunológico, restabelece as resistências naturais da videira e elimina a aplicação de produtos químicos! No Brasil, a Cave de Amadeu está sendo a pioneira no país na implementação desta técnica, com resultados surpreendentes.
Mas a escalada dos vinhos ecologicamente corretos começa de forma mais efetiva com a vitivinicultura orgânica, que implica adoção de cuidados especiais no vinhedo, especialmente a eliminação de qualquer aplicação química de fertilizantes ou agrotóxicos. Na cantina, modernas técnicas de vinificação são adotadas como o controle de pressão e de temperatura nas diversas fases do processo, filtragem com elementos naturais e zero de correção química. As garrafas são paramentadas com cápsulas, rótulos e tinta biodegradáveis.
A produção dos orgânicos está crescendo: no Chile pode ser destacado o vinho da Conosur, na Áustrália o Mount Benson, na Alemanha o Hans Wirsching, no Rhône o Ferraton, na Alsácia o Domaine Huët, no Uruguai o De La Cruz... Para os mais incrédulos, na Borgonha, os vinhateiros Villaine que produzem o Romanée-Conti, elaboram talvez os vinhos orgânicos mais caros do mundo.
A produção mundial de vinhos orgânicos está ultrapassando a casa dos 5%, depois que o consumo multiplicou-se por sete nos últimos três anos. Assumindo uma atitude despojada de preconceitos, está na hora de começar a apreciar, também, os bons vinhos orgânicos!
Os vinhedos podem começar orgânicos, recebendo adubos naturais e tratando das videiras com a calda bordalesa e enxofre ventilado, ou são vinhedos químicos convertidos em orgânicos através de um processo de desintoxicação de alguns anos.
No Brasil, o movimento orgânico teve início na década de 1980, no município gaúcho de Ipê, com a criação da ONG Centro Ecológico, com objetivos de sensibilizar, divulgar e desenvolver a agroecologia. Para produzir uvas orgânicas sob as condições brasileiras, esta entidade desenvolveu técnicas especiais para manejo do solo, práticas nutricionais e ações fitosanitárias. Neste trabalho, foram criados biofertilizantes como, por exemplo, o Super Magro, que foi aprovado e tem sido utilizado em vários países do mundo.
Produtora de vinhos finos, a Velho do Museu, do professor Juan Carrau, cultiva vinhedos orgânicos em Livramento e vinifica em Caxias do Sul. Os vinhos de Cabernet Sauvignon e de Sémillon são os primeiros orgânicos finos do Brasil.
Outra modalidade ecológica de vinhos vem da chamada produção biodinâmica. Nesta, o solo só recebe insumos na forma de pequenas porções de preparados biodinâmicos à base de ervas medicinais, mineral de quartzo e invólucros animais.
Segundo a filosofia, nestes preparados estão concentradas forças naturais e elementares do próprio ambiente (consolidando efetivamente o terroir), que têm a função de acordar nas plantas suas capacidades e potencialidades naturais.
Somam-se a elas, as forças do calor solar mais ou menos intenso e do sutil calor cósmico lunar, planetário e estelar, vindas de seus posicionamentos astronômicos que, segundo estudiosos, traduzem ritmos cósmicos que se identificam com os momentos mais apropriados para agir no ambiente das plantas através de podas, adubações, maneja de solo, vegetação das videiras e assim por diante.
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