A grande crise que se instalou na vitivinicultura brasileira da Serra Gaúcha face à queda do consumo e crescimento desregrado da produção, envolvia preços abatidos e estoques excessivos, fazendo disparar no segundo semestre de 1929, a movimentação de pequenos produtores e comerciantes no sentido de buscar auto-proteção. Esse movimento culminou com a fundação das primeiras cooperativas vinícolas.
Na realidade este foi um processo gradual em que a aglutinação de pessoas foi acontecendo à medida que aumentavam os riscos para cada que continuava trabalhando individualmente e a na proporção em que crescia o conhecimento e a confiança mútua dentro do grupo de cooperados. si.
Os colonos, isolados na zona rural, eram submetidos ao sistema do comprador.
Os comerciantes impunham os preços e as formas de pagamento, não raro alongando os prazos de pagamento, usando este capital para benefício próprio e, sob o pretexto de guardar os valores em lugar seguro, até cobravam taxa. Os colonos sem quaisquer direitos resolveram associar-se “em cooperação”, assim somando forças e configurando uma capacidade de enfrentar “de igual para igual” os “grandes” da cidade, negociando regras mais justas.
Dentro deste contexto, em Bento Gonçalves, produtores passaram a considerar a idéia de se associarem em torno de uma cooperativa vinícola. As primeiras conversas, provavelmente iniciadas informalmente em 1930, foram evoluindo, tomando corpo, até que aos 14 de fevereiro de 1931, o grupo mais central promoveu uma reunião na propriedade rural do Sr. Antônio Pértile, situada na Linha Geral, número 20, 1° Distrito de Bento Gonçalves.
Segundo opiniões de pessoas que acompanharam todo o processo de organização desde o início, a escolha do nome da sociedade foi um momento muito interessante.
Havia um pedreiro italiano em Bento Gonçalves, Luiz Cao, imigrado para o Brasil depois da Primeira Guerra Mundial, que também produzia uva e vinho. Suas duas filhas gêmeas idênticas chamavam a atenção de todos por serem tão parecidas, em suas aparências físicas, roupas, sapatos e penteados, gerando a dúvida de quem seria quem: Alba ou Aurora. Segundo consta, em 1931 com sete anos de idade, elas ajudavam nos afazeres domésticos e, em torno do meio-dia, levavam o almoço do pai, que trabalhava como pedreiro na construção dos primeiros pavilhões da Cooperativa. Como figuras popularmente graciosas, é aceito como uma suposição válida, que inspiraram a denominação da cooperativa, mesmo aí gerando a dúvida, Alba ou Aurora, para finalmente chegar-se à conclusão Cooperativa “Aurora”.
Segundo Valdemiro e Rosa Picoli, foi realizado um churrasco para oficializar e tornar pública a fundação da cooperativa e, neste evento, foram especialmente convidadas e estiveram presentes autoridades da cidade como: Olinto F. Oliveira Freitas, Prefeito Municipal; Amadeu Petrolli, Sub-Prefeito do 1° Distrito; Belo da Cunha Amorim, Coletor Federal; Achylles Mincarone, advogado; Magipe Buses, advogado; Antônio Milani e Fiorelo Ozelame, representantes da Cooperativa Bento Gonçalves.
Os registros acerca da fundação da cooperativa dão conta de que foram dezesseis os sócios fundadores, embora na ata de fundação podem ser contadas dezoito pessoas integralizando cotas de capital na constituição da Cooperativa Agrícola Aurora. Provavelmente, no lapso de tempo entre a solenidade pública e a lavratura a ata de fundação, tenham ocorrido novas adesões, até porque, além destes fundadores, outros 25 produtores foram registrados no livro matrícula, configurando os primeiros associados.
O livro-matrícula, um grosso compêndio de 500 páginas, recebeu o apontamento desta ata, manuscrita em caligrafia impecável de estilo antigo, nos termos seguintes:
“ Ata da Constituição da Cooperativa “Aurora”
Aos quatorze dias do mês de Fevereiro de mil novecentos e trinta e um, na propriedade rural de Antônio Pertile, sita a linha Geral, n° 20, 1° Distrito deste município de Bento Gonçalves, presentes o Sr. Dr. Olinto F. de Oliveira Freitas, M. D. Prefeito Municipal, Sr. Belo da Cunha Amorim, dd. Colector Federal, Dr. Nagipe Buaes, Sr. Achyles Mincaroni, dd. Advogado das auditorias desta Comarca, Sr. Antonio Milani e Fiorello Oselame, representantes da Cooperativa Agricola “Bento Gonçalves” e numerosos agricultores commigo Amedeo Vettorelli, subintendente, digo sub-prefeito do 1° distrito, servindo como secretário para este acto, por indicação dos presentes assumiu a presidencia dos trabalhos o Sr. Dr. Prefeito Municipal, que, depois de explicar os fins da reunião, determinou a leitura dos estatutos para discussão e aprovação. Após a leitura foram approvados unanimemente. Ditos Estatutos constam de um livro especial, occupando 32 folhas escriptos em uma só laudo e cuja materia acha-se distribuida em oito capitulos com setenta e um artigos. Em seguida tendo desde logo entrado em vigor os estatutos, de accôrdo com os mesmos procedeu-se á eleição da 1° Diretoria que por unanimidade ficou assim constituida: Director-presidente: Guilherme Fontanari; Director comercial: Ernesto Caron; Director Gerente: Romano Constantino; Conselho deliberativo, José Baú, Zatt Irmãos, João Cordazzo, José Possamai e Anselmo Piccoli; Conselho Fiscal: Angelo Schanato, Jose Dall’Oglio e Santo Cobalchini. Suplentes: Carlos Torconi, Antonio Pertile e Libero Puerari.
A seguir procedeu-se a formação do capital pela forma seguinte: Ernesto Caron e Zatt Irmãos cincoenta acções cada um; José Baú, Anselmo Piccoli e José Pessamai vinte acções cada um; Antonio Pertile quinze acções; Romano Cobalchini, Ernesto Pessamai, Guilherme Fontanari, João Cordazzo, Luiz Moret, Libero Puerari, Irmãos Turconi, Antonio Crestani e Felis Roman dez acções cada um; Jose Mafessoni cinco acções; a asemblea deliberou manter abertas as inscripções até a integralização do capital, autorizando a Diretoria Executiva a subscrever o original dos Estatutos aprovados e a lavrar os termos de abertura e encerramento rubricando as respectivas folhas do livro no qual, ditos estatutos, foram lançados. O Sr. Presidente extendendo-se em considerações sobre o acto, deu posse a Diretoria recem eleita, declarando definitivamente installada a Cooperativa “Agricola Aurora” fazendo votos pela sua prosperidade em beneficio do progresso economico deste municipio. Foi ainda feota a comunicação official de fundação da nova Cooperativaao meretíssimo Governo do Estado. O Sr. Presidente após deu a palavra a quem della quisesse fazer uso e como ninguem a pedisse declarou encerrada a presente sessão, de que para constar foi lavrada acta que lida e achada conforme, vae assignada por mim secretario, pelo presidente, pela Diretoria e demais pessoas presentes. "
No dia 14 próximo vamos festejar os 80 anos da lider brasileira Vinícola Aurora!
Um comentário:
densermSou a filha mais nova de Fiorello Ozelame e foi uma enorme surpresa para mim saber, ao ler esta matéria, que o meu pai também participou da criação da Cooperativa Viícola Aurora. Sabia do envolvimento dele em muitos movimentos da comunidade bentogonçalvense, mas esta realmente foi uma grata surpresa... A final, faz tanto tempo que ele se foi e é muito bom descobrir coisas das quais não vivenciei. um abraço! Ana Lúcia Ozelame
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