domingo, 17 de abril de 2011

CARMENÈRE: O RESGATE ACIDENTAL NO CHILE

A casta Carmenère, antigamente uma típica variedade de Bordeaux, França, era presença constante nos cortes, produzindo assemblages típicos com a Cabernet Sauvignon, Merlot, Côt Cabernet e Petit Verdot. 

A videira Carmenère, porém, conheceu um período de fragilidade como planta, apresentando problemas que ocorriam especialmente na maturação dos seus cachos, acometidos de uma doença que murchava os bagos e quebrava a produtividade, fator importante dos primórdios da vitivinicultura francesa.

O golpe final veio após a década de 1860, com o flagelo da filoxera, que devastou os vinhedos europeus e induziu à sua reconstituição através das videiras enxertadas. Nesse momento, na retomada seletiva das vinhas em Bordeaux, a Carmenère foi descartada e, assim, considerada variedade extinta do encepamento mundial, embora sua eliminação total fosse problemática, uma vez que os vinhedos bordaleses da época exibiam composição varietal mesclada.

As condições adversas apresentadas pela Carmenère fizeram com que a Cabernet Sauvignon, a Merlot e a Petit Verdot fossem se consolidando como presenças únicas obrigatórias na maioria dos cortes bordaleses.


No Chile, a ampliação das castas francesas nos vinhedos ocorreu com grandes importações de mudas de Merlot da França, que deram impulso à formação de extensos vinhedos desta casta. Posteriormente, quando atingiram a idade de produção, surgiram problemas na vinificação – os vinhos traziam certo amargor e um toque vegetal exagerado (pirazina).

A anomalia ocorria em maior ou menor grau, dependendo do vinhedo, mas induzia até a pensar que o Merlot não iria jamais de adaptar aos terroirs chilenos.

Em 1994, o jovem ampelógrafo francês Jean-Michel Boursiquot, visitando os vinhedos chileno e estudando especialmente os problemas locais da Merlot, reparou que num mesmo vinhedo havia manchas de cores diferentes em folhas novas, e que apresentavam maturação tardia em cerca de um mês.

Pesquisando mais minuciosamente os dois tipos de videira e assistindo a brotação de seus sarmentos novos, Boursiquot verificou que as videiras tardias eram minoritárias e que eram elas que conformavam as manchas de cor diferente, pois suas folhas novas eram da cor carmim, enquanto que o resto do vinhedo era de um verde bem claro.

Investigando outros descritores, certificou-se o estudioso francês de que as manchas de videiras diferentes correspondiam à variedade bordalesa Carmenère, que eventualmente havia ficado misturada à Merlot nos viveiros franceses que exportaram para oChile.

Dos estudos de Boursiquot renascia a Carmenère para uma vida nova, num país novo, do qual se tornaria casta emblemática.

No dia 26 de novembro de 2009, no grande salão oval de tanques de vinificação da Bodega Clos Apalta, da Viña Lapostolle, quando esta redescoberta da Carmenère completava 15 anos, foi, como uma jovem, a debutante no grande jantar de gala de encerramento do Primeiro Seminário Colchagua Carmenère, no qual a Ministra da Agricultura se juntou na primeira homenagem oficial de reconhecimento público do grande feito do ampelógrafo Jean-Michel Boursiquot.

Em dezessete anos a Carmenère amadureceu e, juntamente com a Cabernet Sauvignon e a Chardonnay, formam o trio de ouro da vitivinicultura de alta qualidade do Chile.

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